quarta-feira, 25 de maio de 2016

Análise de Discurso - Artigo

Artigo escrito para a Matéria de Analise de Discurso com orientação da professora Joana Ormund.

Análise do Artigo “Bela, recatada e do Lar” e suas releituras redes socais.

Carlos de Souza RA: C66GHC-0
Desyrrê Curtarello RA: C70042-8
Marina Correia Dantas RA: C68HEA-0

Resumo: Este artigo analisa a reportagem “Bela, recatada e do lar” da VEJA online e contextualização papel da mulher na sociedade. Usando a análise de discurso de linha francesa e as ideias de Erni Orlandi para estudar as influencias e ideologias contidas nesta reportagem, fazendo uma relação com as redes sociais.
Palavras-chave: Análise de Discurso, figura da mulher, redes sociais, intertextualidade.

Abstract: This article analyzes the article "beautiful, demure and home" VEJA online and contextualizing the role of women in society. Using the french line of discourse analysis and Erni Orlandi ideas to study the influences and ideologies contained in this report, making a relationship with social networks
Keywords: Discourse Analysis, woman figure, social networks, intertextuality.

Introdução

Este artigo visa fazer uma análise do artigo publicado pela revista VEJA em sua edição online no dia 18 de abril de 2016 sobre Marcela Temer, esposa do então Vice-presidente da Republica Michel Temer, intitulado: “Bela, recatada e do lar”

Usando elementos da teoria de análise de discurso de linha francesa para investigar as marcas ideológicas presentes no texto assim como seu contexto histórico, seu impacto na política e como esta notícia foi vista pelos leitores.

Assim como também exploraremos a intertextualidade que este artigo acarretou em diferentes mídias sociais, transformando seu objetivo inicial e tornando-se motivo de discussão e polemica entre diferentes grupos ideológicos.

1. Análise de Discurso

Analise de discurso é o lugar em que se pode observar a discussão entre língua e ideologia. Mais do que ideologia analisa também as áreas psicológicas, linguísticas e marxistas da língua social atual.

Orlandi (2001) argumenta que podemos dizer que a AD constitui- se como uma disciplina de entremeios, fazendo- se na contradição dos três campos do saber. Dito de outro modo, a AD se faz entre a linguística e a ciências sociais. Se, por um lado, interroga a linguística e exclui ou que é histórico social ao pensar a linguagem, por outro lado interroga a ciências sociais na medida em que estas não consideram a linguagem em sua materialidade.

Porém, a AD não é uma resposta as questões sociais e de linguagem apenas é um deslocamento necessário do campo de pesquisa e cria uma nova perspectiva em relação entre a sociedade e a linguagem.

A partir deste ponto analisaremos de acordo com as primícias de AD os elementos que compõe o artigo “Bela, recatada e do Lar”.

1.1. Contexto histórico

Este artigo foi publicado durante um momento histórico para o governo, a primeira mulher a chegar à presidência sofria pressões internas e externas e era acusada de crimes contra a Constituição, o que levaria ao Impeachment e provável afastamento de sua vida política.

Foram necessários várias acusações e processos por parte de diferentes partes do governo antes que um deles fosse aceito e a acusação feita pela OAB fosse entregue na Câmara para julgamento. A presidente Dilma foi acusada por crimes de responsabilidades fiscais, “pedaladas fiscais” e abriria então o processo de impeachment contra ela.

Os tramites envolvendo a destituição do presidente de seu cargo são longos e envolvem os votos tanto do Senado quando da Câmara dos Deputados, sendo que mais de dois terços do votos devem ser a favor para que o processo siga em frente.

O processo de impedimento do mandato de Dilma foi entregue a Câmara em meio a uma grande cobertura da mídia e todos os envolvidos foram colocados em exposição constante, atitudes e ideologias foram colocadas em evidência.

Durante as acusações contra a presidente ficaram cada vez mais evidentes os partidos foram retirando o apoio no governo federal e consequentemente os Ministérios deixaram de ser comandados por seus ministros originais e muitos deles não tinham previsão de reposição por parte da presidente.

Neste momento quem toma a frente da mídia, e torna-se o foco principal das discussões políticas é o então Vice-presidente Michel Temer, pois este seria a pessoa a tomaria o lugar de Dilma, Michel Temer começou a realizar reuniões em sua residência com sua base aliada. Com isso os “gritos” de golpe misturaram-se aos que discursavam contra a legitimidade do processo aberto de impeachment.

A figura política que Michel Temer tornou-se ainda mais proeminente na mídia, pois se antes ele era o Vice-presidente do Brasil agora ele era visto como a próxima pessoa a governar o País. Como consequência a vida privada do talvez futuro presidente também começou a virar motivo de especulações e análise.

Neste contexto tão instável a jornalista Juliana Linhares publicou um artigo cuja figura principal é a esposa de Michel Temer, Marcela (Anexo 1). O artigo talvez não tivesse a atenção que recebeu caso o contexto político do país não fosse tão precário e as críticas as ideologias pregadas não fossem levadas a um entendimento mais complexo do panorama global. Porém, o artigo tomou uma posição ideológica que levantou muitas questões tanto quanto as ideias do presidente do papel da mulher tanto como vemos este conceito refletido na atualidade.

1.2. Contexto Ideológico

Mesmo depois de décadas de luta por igualdade, a mulher ainda é conhecida como o sexo frágil. Esse pensamento ainda não foi totalmente desmentido na sociedade e ainda é sustentado em diversas culturas, propagando assim a desigualdade entre os dois gêneros e preconceito generalizado.

A figura da mulher é constante tópico de discussão na atualidade, onde os direitos a que elas tem acesso muito maiores do que em qualquer época. A luta por igualdade vem no último século tomando uma parte importante dos debates em várias esferas de poder diferentes, a política um dos principais palcos a serem debatidos.

Ainda que tenhamos tecnologia de ponta, que encontremos agua em Marte e mulheres seja arrimo de família a sociedade ainda às vê como um ser secundário sem prestigio e de bastidores, sendo o homem sempre a figura central.

É aceitável que uma mulher seja dona de casa e que o companheiro tenha um título importante, mas é o contrário sendo motivo de chacota e escarnio para os demais. É com esse pensamento que fica evidente no artigo o papel que a jornalista acha que uma mulher deve ocupar. O de primeira-dama. Não de presidente.

A mulher ainda não é vista com bons olhos quando esta é colocada no cenário político, esfera predominantemente dominada por homens. São poucas aquelas à conseguirem seu espaço e devem defende-lo, não apenas de ataques externos (outros políticos), mais também de ataques internos (pressão sofrida pela própria família) pedindo que elas afastem-se do mundo político. Fora os ataques morais constante neste tipo de situação.


1.3. Analise do texto

Marcela Temer é uma mulher de sorte. Iniciando o texto com está frase, já podemos levantar questionamentos sobre o que a autora queria dizer com sorte. Ela é casada a treze anos com Michel Temer, o presidente interino, quarenta e três anos mais velho, porém não fica claro o que ela ganhou ao ser sortuda. Seria sua estabilidade financeira, sua aparente felicidade conjugal ou apenas seu status como mulher de uma pessoa famosa.

Fica claro que existem diversos elementos a serem julgados, o artigo cita que sua felicidade é devido a paixão que seu devoto marido ligando de forma absoluta sua vida aos cuidados que este presta a ela, mas não dialoga sobre a vida dela de maneira separada dele. Ela parece apenas um complemento do que um homem público deveria representar a sociedade, uma representação perfeita da primeira-dama.Como artigo diz, uma mulher perfeita. Seguindo os conceitos estabelecidos pela sociedade, que ainda vê a figura da mulher como aquela que deve ficar em casa, cuidado do lar e vestindo-se da forma que esta dita como recatado (segundo o texto: “gosta de vestidos na altura dos joelhos”).


A rotina da família gira em torno de Temer, os compromissos familiares, a agenda de Marcela e a rotina das casa dependem sempre da vontade e da disponibilidade dele, sendo que viagens e outros compromissos programados por ela são facilmente adiados por responsabilidades políticas de Temer.

A vida dela se resume a cuidar da casa e um pouco dela mesma, nunca parecendo fugir do bordão que lhe atribuíram “vice primeira dama do lar”. Seguindo esse raciocínio podemos dizer que o artigo leva ao pensamento de que mulheres devem apenas ser donas do lar, suas vidas e interações dependendo somente do marido sem nenhum outro tipo de atribuição.

As preocupações atribuídas a Marcela são vistas por muitas outras feministas como um retrocesso em todas as conquistas que estas tiveram ao longo do tempo. Não é errado pensar que uma mulher pode ficar à frente de seu lar e não querer outras responsabilidades, porem o artigo tem um tom antiquado que leva a conclusão talvez precipitada de que mulheres servem somente como objetos de adorno.

Mesmo ao falar sobre seu papel na monitoria das redes sociais do marido, o discurso nos remete a futilidade e superficialidade da função que ela parece exercer dentro do círculo de influência de Temer.

Um aspectos de AD analisado durante a leitura e posterior repercussão do artigo, é a do apagamento ideológico que ocorre quando o mesmo se torna público. Os assujeitados pelo discurso desta matéria parecem esquecer qual pode ser uma das motivações do mesmo: O desvio de atenção do processo de impeachment e as transações que ocorriam no Palácio do Jaburu.

2. Intertextualidade

Capacidade de interação de um texto com outros, e também com diversas vozes intercaladas entre si. Assim, um discurso nunca vem desprovido de carga ideológica.

2.1. Mídias Sociais

Um fator muito interessante de analise deste texto em particular, foi sua repercussão e propagação dentro das mídias sociais. Esse desencadeamento pôde ser observado em diversos meios de comunicação, sendo a rede social Facebook, o maior propagador.

Ainda que a reportagem nos mostre uma ideologia de uma parcela da população e que foram vários aqueles que se mostraram contrários a este pensamento, o próprio texto nos faz acreditar que este tipo de atitude não é uma exceção.

Alguns dos exemplos abaixo, mostram a revolta e indignação de certa parte da sociedade. Eles fazem referência ao artigo original, porem aproveitam para ligar outras ideias e pensamentos que vão de contra o apresentado no texto em sua primeira leitura.

 Figura 1 - Frida Kahlo

FIGURA 1 – FRIDA KAHLO

Frida foi uma figura marcante no cenário artístico do seu tempo, virando um ícone por sua atitude forte em relação a sua identidade tanto pessoal como profissional. Tendo durante sua vida defendido o direito da mulher a ser o que quisesse e não se deixando enquadrar nos padrões sociais.

Figura 2 - Feminista

FIGURA 2 – FEMINISTA

Símbolo do feminismo, este cartaz foi originalmente confeccionado durante a Segunda Guerra Mundial para incentivar as mulheres a participarem do esforço de guerra, com os dizeres “We can do it”. Atualmente ele é uma representação da força feminista.

As fotos foram extraídas do seu contexto original e trazidas para uma nova leitura, nestes casos acima criticando de forma aberta o discurso presente na reportagem. Mostrando de forma bem humorada as mulheres em diferentes contextos sociais, onde elas são representadas como figuras de poder.

Esta atitude vexatória por parte destes sujeitos contribuiu para o maior apagamento dos diversos discurso tão mais importantes dentro do contexto da situação política do que apenas um modelo social mostrado em uma reportagem.

3. Considerações finais

A partir da análise e interpretação das constatações mostradas ao longo do texto, podemos concluir que o artigo tem sim um contexto retrogrado e voltado ao pensamento machista, porém não é o único foco utilizado.

Utilizando também da perspectiva de distração do público, a reportagem serviu de pano de fundo para uma distração por parte de diferentes camadas do governo, tentando assim desviar a atenção do real problema e das manifestações no território brasileiro.

E como finaliza a própria reportagem: Michel Temer é um homem de sorte.

segunda-feira, 16 de maio de 2016

Plano de aula

Plano de aula.
Disciplina:
Língua Portuguesa/ literatura.
Tema da aula:
Blog/pag. no facebook sobre arcadismo (literatura em Portugal no século XVIII), obras e sociedade.
Duração:
4 aulas (50 minutos de duração cada aula).
Publico alvo:
Alunos do 1º ano do ensino médio (faixa etária 14 anos aproximadamente).
Conteúdo:
Conteúdo histórico
- características do período literário
-autor e obra (A negra fúria ciúmes e Prazer. Efêmero)
-comparação com a língua atual e da época com as novas mídias
Objetivo:
Apresentar novos horizontes literários e uma linguagem além do senso comum, comparando a língua escrita/ falada atual com a língua da época.
Mostrar a evolução da sociedade e a influencia em seu cotidiano.
Justifica:
Incentivar o aluno a buscar no passado respostas para um presente adequado e um futuro melhor é dever de todo educador.
Ao trazer a literatura e texto consagrados e apontar compreensão da sociedade hoje através modos e costumes, dispersando o aluno para  além  das  paredes escolares usando ferramentas altamente conhecidas ( como blog e facebook), podemos aproximar os dois  mundos de modo dinâmico e de fácil compreensão.
Metodologia e didática:
Os textos apresentados serão do mesmo movimentos  (arcadismo), Bocage , apresentando ao aluno versões mais atuais e outras típicas do século XVIII, juntamente a dicionários e traduções dos próprios. Uso do Facebook.
Critérios de avaliação:
-Debate e montagem de um julgamento sobre autor e a sociedade da época ;
-Montar fórum no blog para que os alunos possam discutir sobre o assunto;
-Prova escrita;
-Prova oral.
Bibliografia:
Massaud  Moises : A literatura  portuguesa, Cutrix 36º Ed . /2008.
Cereja Willian , Cocha Tereza: Literatura portuguesa, Atual 3º Ed./2009.
Saraiva José Antôni: Iniciação a literatura portuguesa, Comp. Das Letras 2º Ed./2001.
  

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Bocage - Poema Sobre Ciúmes

A Negra Fúria Ciúme

Morre a luz, abafa os ares 
Horrendo, espesso negrume, 
Apenas surge do Averno 
A negra fúria Ciúme. 

Sobre um sólio cor da noite 
Jaz dos Infernos o Nurne, 
E a seus pés tragando brasas 
A negra fúria Ciúme. 

Crespas víboras penteia, 
Dos olhos dardeja lume, 
Respira veneno e peste 
A negra fúria Ciúme. 

Arrancando à Morte a fouce 
De buído, ervado gume, 
Vem retalhar corações 
A negra fúria Ciúme. 

Ao cruel sócio de Amor 
Escapar ninguém presume, 
Porque a tudo as garras lança 
A negra fúria Ciúme. 

Todos os males do Inferno 
Em si guarda, em si resume 
O mais horrível dos monstros, 
A negra fúria Ciúme. 

Amor inda é mais suave, 
Que das rosas o perfume, 
Mas envenena-lhe as graças 
A negra fúria Ciúme. 

Nas asas de Amor voamos 
Do prazer ao áureo cume, 
Porém de lá nos arroja 
A negra fúria Ciúme. 

Do férreo cálix da Morte 
Prova o funesto azedume 
Aquele a quem ferve n'alma 
A negra fúria Ciúme. 

Do escuro seio dos fados 
Saltam males em cardume: 
O pior é o que eu sofro, 
A negra fúria Ciúme. 

Dos imutáveis destinos 
Se lê no idoso volume 
Quantos estragos tem feito 
A negra fúria Ciúme. 

Amor inda brilha menos 
Do que sutil vagalume, 
Por entre as sombras que espalha 
A negra fúria Ciúme. 

Bocage, in 'Quadras' 

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Bocage - Contexto Histótico

BOCAGE

Se é possível falar em um homem entre fronteiras, esse homem é Bocage: o das anedotas sujas e criações obscenas ao lado de poemas sensíveis, plenos de confissões amorosas, amargura e sofrimento, e mais: um homem situado entre dois mundos, entre as regras rígidas de um Arcadismo decadente, refletindo um mundo racional, ordenado e concreto, e a liberdade de um Romantismo ascendente, quando a literatura se abre à individualidade e à renovação. Bocage é um homem do seu tempo e à frente do seu tempo.
Esse é o tempo de Manuel Maria l’Hedoux Barbosa du Bocage, segundo filho do advogado José Luís Soares Barbosa e de Mariana Joaquina Xavier Lestof du Bocage, que nasce em Setúbal, em 15 de setembro de 1765.
Aos dezesseis anos, o jovem e brilhante Ma­nuel Maria é já militar em sua cidade natal, trocando-a, em 1783, por Lisboa, ao alistar-se no corpo da Marinha Real. A idéia, entretanto, de um futuro promissor logo se desfaz em favor da sedução da ociosidade dos botequins e de uma vida de boêmia, por onde circulam fidalgos e frades alucinados, gente de vida fácil e amores incon­táveis: de Marília, Tirsália, Jônia, Nise, entre outras, até chegar a Gertrude, a Gertrúria da Arcádia. É quando os poemas de especial sensibilidade surgem, lado a lado, com as improvisações não raro obscenas.
É por amor a Gertrude que, em 1786, Bocage parte para a Índia, com passagem pelo Rio de Janeiro. Vive dois anos em Goa, dois anos de grande decepção com a pior das terras, a que chama de esta república de loucos, de profundas saudades de Portugal, da margem deleitosa do Tejo e, sobretudo, de enlou­quecedor ciúme de Gertrude 
Em 1789, promovido a tenente de infantaria, é colocado em Damão, mas, apenas dois dias depois da chegada, deserta. E após um breve envolvimento com uma mundana famosa, Ana Jacques Manteguí, parte para Macau, quando conhece, ao lado da nostalgia da pátria, e da ausência de Getrude – Adeja, coração, vai ter aos lares,/ Ditosos lares, que Gertrúria pisa; [...] Dize-lhe, que do tempo o leve giro/ Não faz abalo em ti, não faz mudança,/ Que ainda lhe és fiel neste retiro – , a miséria.
Finalmente, em 1790, com 25 anos, Bocage consegue ajuda para regressar a Lisboa, onde a predesti­nação se confirma: vive a grande desilusão de encontrar a amada Gertrude casada com o seu irmão mais velho. Daí a retomar a vida boêmia e desregrada, entre botequins e tertúlias, foi apenas um passo.
A novidade fica por conta do ingresso na Academia Literária Nova Arcádia, cujos encontros são realizados nos salões da casa do conde Pombeiro. Não tarda, entretanto, para que essas quartas-feiras de Lerenosejam satirizadas pela irreverência do seu temperamento, e nisso Bocage é implacável. Primeiro, ataca seu presidente, depois, os seus pares mais notáveis; trava-se, então, uma verdadeira guerra verbal e os insultos beiram a obscenidade.
Em 1791, Bocage publica o primeiro tomo das Rimas, firmando a sua reputação poética, mas as composições satíricas e eróticas continuam a desferir profundos golpes na moral, na política e na religião vigentes. A situação torna-se insustentável, o poeta é expulso da Nova Arcádia e, três anos mais tarde, em 1797, é preso e processado pelas irreve­rências antimonárquicas e antica­tólicas, acusado por conspirar contra a segurança do Estado e pela autoria de papéis ímpios, sediciosos e críticos. Primeiramente recolhido à cadeia do Limoeiro, é, depois, por influência de amigos e mediante muitas súplicas e retratações, transferido para o mosteiro de São Bento e deste para o mosteiro dos Oratorianos. Retira-se a acusação contra o Estado, permanecendo apenas contra a religião, o que é considerado um delito de menor gravidade.
O ano de 1799 marca o regresso do poeta à liberdade, quando se entrega ao álcool, ao tabaco e ao trabalho, publicando o segundo tomo de Rimas. Já, então, os excessos de toda a sua vida se fazem sentir e um aneurisma coloca-o, definitivamente, no leito. Em 1804, é publicado o terceiro volume de Rimas e, um ano mais tarde, em 21 de dezembro de 1805, aos 40 anos, Bocage morre em Lisboa. Diz-se que reconciliado com seus inimigos e com Deus, mas dificilmente reconciliado consigo próprio. Folgará de viver, quando não passa/ Nem um momento em paz, quando a amargura,/ O coração lhe arranca e despedaça?// Ah! Só deve agradar-lhe a sepultura/ Que a vida para os tristes é desgraça/ “A morte para os tristes é ventura”. Foi um desadaptado na vida e no tempo. O Elmano Sadino – este foi o pseudônimo adotado por Bocage na Nova Arcádia; Elmano é anagrama de Manoel, e Sadino, aquele que mora perto do rio Sado, que passa em sua cidade natal – é um romântico por temperamento.
Didaticamente apontam-se três fases para a poe­sia bocagiana: a da mentira arcádica, a da confissão amorosa escrita sob as regras árcades e a dos poemas curtos, de sofrimento e morte. Na verdade, as três se interpenetram. Pela capacidade, Manuel Maria du Bocage está à frente dos escritores do seu tempo, mas representa bem o Arcadismo pelo domínio do lirismo geral e amoroso de sua poética.
Embora dominasse as regras da poesia árcade, o temperamento irrequieto e insatisfeito de Bocage fez com que se afastasse dela quando quis. Na verdade, ele é a personalidade mais representativa de uma crise que, mais do que gosto e estilo, atinge o próprio teor da vida literária e os preceitos arcádicos e iluministas.
Homem de sentimentos desmedidos, irrita­diço, insatisfeito com a ideologia político-religiosa, impulsivo e ciumento, Bocage projeta-se inteiro em sua cria­ção. Cultiva a poesia satírica e a lírica, em forma de idílios, enaltecendo a vida rústica bem ao gosto árcade, odes, em que se destacam as dirigidas à Virgem Santíssima, epigramas, canções amorosas com excessivo apoio mitológico, cantatas, canço­netas, epístolas etc. São, entretanto, os sonetos o ponto mais alto da inspiração poética‚ o que melhor expressa a dimensão do talento e o que melhor evidencia a trajetória estética e humana de Bocage: dos preceitos árcades à liberação dos sentimentos reprimidos ou egotistas, coincidentes com um Romantismo em ascensão.
Ao longo dos sonetos, e há mais de 400, a par dos satíricos, existe um percurso definido cujo ponto inicial é marcado pela Arcádia e daí para a confissão amorosa e amarga, mas ainda presa à alego­rização, à mitologia, à contenção racional, uma libertação que não é, enfim, total. Assim, pode-se dizer que predomina, no conjunto da obra, o impulso romântico sobre reminiscências neoclássicas, onde, via de regra, o poeta não consegue desvincular-se da fraseologia árcade e da influência camoniana. 
Assim, se o entre-fronteiras é a marca de Bocage na história da Literatura Portuguesa, se sua poesia é o encontro que assinala a decadência de um estilo – árcade – e o limiar de outro – romântico –, o exercício da arte e a dimensão humana que daí avulta colocam esse criador de anedotas sujas e de poemas obscenos, nessa mesma história, como mestre do soneto ao lado de Antero de Quental e, enfim, como perseguiu a sua vida inteira, ao lado de Luís de Camões.
Texto da apresentação do livro O delírio amoroso, L&PM POCKET, por Jane Tutikian

Obras de Bocage


Cantiga à Morte de D. Inêz de Castro
O Triunfo da Religião
A Virtude Laureada
A Pavorosa Ilusão
Poesias
Elegia
Mágoas Amorosas de Elmano
Improvisos de Bocage
Convite à Marília
Pavorosa Ilusão da Eternidade
Pena de Talião
À Puríssima Conceição de Nossa Senhora
À Morte de Leandro e Hero
Queixumes do Pastor Elmano Contra a Falsidade da Pastora Urselina

Para outras informações e analises de sua obra visite o Blog: